27.8.09

TANKA – LV



em águas carentes

o murmúrio das vontades
geram tudo surdo
só eriçam a superfície
quando o nada vai ao fundo



HAIKU – LVI



todas essas estrêlas

a boiar em tua sopa
acendem os teus olhos



26.8.09

TANKA – LIV



são gritos passivos

a polirem labirintos
onde de passivas
as esperas se emancipam
à falta do ato são



HAIKU – LV



no fim do verão

passam aves migradoras
é hora de entrar



24.8.09

HAIKU – LIV



a ilusão de crer

em imagens dentro de espelhos
vida-labirinto



TANKA – LIII (militante)



nos meus dias de

guerra palco e botequim
foi o teu sorriso
na turba fria de seixos
a pedra-olhar que deu lume



21.8.09

HAIKU – LIII



nas brechas das horas

vazam as areias do tempo
ânsia de escrever



TANKA – LII



do fundo abissal

à praia e então subir
até o Himalaya
onde que só houvesse céu
e que o céu se dissipasse



20.8.09

TANKA – LI



o pousado em nós

distende molas preguiças
acolhe e alicia
faz convergir no cristal
o abstrato de uma fuga



HAIKU – LII



entre a vida e a morte
dança um inseto preso ao fio
no nascer do dia



19.8.09

TANKA – L



transversal à dor

meu sorriso puxa um fio
no (rés) sentimento
nasce um novo que desfia
lenços emoções lamentos



TANKA – XLIX



certezas são dados

lançados na mesa esquiva
de um caleidoscópio :
de vínculos imprevistos
só o acaso lerá a sorte



HAIKU – LI



nas brechas das horas

vazam as areias do Tempo
o verão se vai



18.8.09

TANKA – XLVIII



cessar a ilusão

de ser luz dentro de um prisma
e então apagar-se.
renascer em arco-íris
e acreditar no fugaz



HAIKU – L



o hálito da noite

voz de gato e madressilvas
só os outros que dormem



17.8.09

HAIKU – XLVIX



entre sol e lua

os meus dias se convergem
no meio da rua



HAIKU – XLVIII



um final feliz :

do salto à queda mortal
levanta-se a atriz



TANKA – XLVII



em todo diamante

a solidez mineral
brilha e dissimula
no vinco duro da aresta
o frágil ser do cristal



14.8.09

HAIKU – XLVII



no encontro das horas

nos ponteiros de um relógio
nossos desencontros



TANKA – XLVI



diante do espelho

o olhar na pele é pedido
(após tanta espera)
que a apreensão se enrugasse
muito acima dos sentidos



HAIKU – XLVI



pássaros pousados
sobre cinco fios elétricos
música no ar




TANKA – XLV



como atravessar

uma ponte que se perde
no meio das brumas
sob os arcos de silêncio
só o vazio é o que nos une



HAIKU – XLV



contemplar a lua

que bóia em rio caudal
a contra corrente



13.8.09

TANKA – XLIV



temor é erosão

dos limites da certeza
além de noção
o impensável nascerá
da usura dos acasos



HAIKU – XLIV



bôlha de sabão

a própria fragilidade
flutua no ar



12.8.09

TANKA – XLIII



em dias assim

o guardião dos remorsos
cego surdo e mudo
libera enfim a memória
de todos os seus cristais



HAIKU – XLIII



na noite estrelada

dançam ágeis os instintos
desfolham-se essências



11.8.09

TANKA – XLII



último recurso

é não mudar : conhecer
o prisma e a luz
só no além da refração
reafinar a retina



TANKA – XLI



no exílio dos dias

condenado a ser um sol
em mar de silêncios
como se um farol atroz
o impedisse de ser noite



10.8.09

HAIKU – XLII



nada o espelho sabe

daquilo que ele reflete
não se compromete



TANKA – XL



depois de dormir

de olhos abertos num sonho
dói acordar na
falsa incerteza de ser
o que sempre ou nunca fomos



TANKA – XXXIX



despir-se (quem sabe
)
poderia vir a ser
último desgarre
antes do sofá pintado
no carrossel das carências



9.8.09

TANKA – XXXVIII



disse só : - me espera.

desapareceu. na praia,
à espera, ficou.
noite já, em desespero,
lança-se ao mar. e nada.



TANKA – XXXVII (pas de deux)



com o fechar da porta

abriram-se vãos na tarde
ficou só a pavana
de dois olhos boquiabertos
varando ausências na sala



TANKA – XXVI



escolha afetiva

quando concede um alcance
ao gesto cativo
o resgatável flutua
à deriva do intangível



8.8.09

HAIKU – XLI



amassam-se coxas

dobras e dorsos em dobro
... se se amassem, poxa ...



HAIKU – XL



estrêla cadente

risca no céu um instante
e eu paro no tempo



TANKA – XXXV



abaixo do visto

há sempre um chão que encolhe o
limiar da fera
que inocente aflora à
superfície do desejo



TANKA – XXXIV (quintessência)



cada gesto exala

uma fragrância que ascende
dança e embaralha
brilha e arde acende altares
faz dela mesma um incenso



TANKA – XXXIII



ante a folha branca

toda angústia se reduz
a ser alçapão
a essa música volátil
que me cantam as sereias



7.8.09

TANKA – XXXII



farejar memórias

em fósseis águas mundanas
nos próprios vestígios
como um peixe que ainda busca
águas que já o esqueceram



HAIKU – XXXIX



em um tempo surdo

que vê escreve lê e ri
nunca houve tudo



6.8.09

HAIKU – XXXVIII



do aço do olhar

despede-se um estilhaço
que me assoma. depois some.



TANKA – XXXI



sol do meio-dia

é fio de faca que entalha
fere, não revela
a sutil cumplicidade
entre o corpo e sua sombra



5.8.09

TANKA – XXX



é por uma fresta

entre os cristais de um instante
que acontece ; e
renunciando ao abismo
faz-se mais leve que o ar



TANKA – XXIX



um poder ser livre

como a curva de uma nuvem
que se descontrai
e imitando coisa alguma
vai e desata seus limites



4.8.09

HAIKU – XXXVII



minha vida eu curvo

ante a sopa que fumaça
como reverência



3.8.09

HAIKU – XXXVI



os medos retidos

no silêncio das paredes
falam alto – às vêzes



2.8.09

TANKA – XXVIII



do passado um foi

cruza um é aqui e agora
na interseção do
único alcance possível :
o instante de um ter sido



TANKA – XXVII (era uma vez feminina)



a nudez da água

mostra-se inocente na
jarra de cristal ;
de carências intestinas
surge então (fatal) a sêde ...



HAIKU – XXXV



contra um sol vermelho

grasnam dois corvos no céu
guardo meus pincéis



HAIKU – XXXIV (quase um haikai)



pois é… tua boca

na minha bloca o que eu
queria dizer